Lisboa, 13 de Fevereiro de 2020 – Liga Portuguesa dos Direitos Humanos – Civitas pronuncia-se contra a Directiva n.º 1/2020 da PGR e contra o Parecer n.º 33/2019 do Conselho Consultivo.

No dia 4 de Fevereiro de 2020, a Senhora Procuradora-Geral da República (PGR) assinou a Directiva n.º 1/2020 (Diretiva) aprovando o Parecer n.º 33/2019 do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República (Parecer).

No dia 11 de Fevereiro de 2020, a PGR assinou um Despacho suspendendo a publicação da Diretiva em Diário da República e solicitando um parecer complementar para análise da conclusão 10.ª do Parecer, pertinente ao registo de decisões tomadas internamente.

Portugal convive com um grave problema de acesso à Justiça, de funcionamento da Justiça e de dignificação da Justiça. Ao contrário do que é referido frequentemente, a Justiça não tem que ser dignificada no vazio; a Justiça deve sim ser responsável por fomentar e merecer a dignidade que a deve caracterizar.

O Ministério Público tem uma actuação vital na defesa do interesse público e na investigação e desenrolar de processo judiciais, em particular e porventura mais sujeito a pressões, nos casos de corrupção e de abuso de poder. Logo, a independência e transparência na actuação do Ministério Público são vitais para assegurar um dos Pilares Fundamentais do Estado de Direito e da Democracia.

Nos tempos que correm, em que cada vez mais são postos em causa os princípios da Justiça e do seu funcionamento, que o escrutínio público é cada vez maior; a sancionação do referido Parecer e a possibilidade de superiores hierárquicos poderem alterar investigações e processo em curso sem que ninguém disso possa tomar conhecimento, parece-nos ser contrário ao interesse público, à defesa de uma Justiça sã e ao crescente combate que tem sido tecido contra a corrupção em Portugal.

Se é certo que existe uma hierarquia definida no Ministério Público, também é claro que o PGR é nomeado e exonerado pelo Presidente de República sob proposta do Governo, podendo no limite colocar-se uma hipotética ingerência do poder executivo sobre o poder judicial.

Considera a Liga Portuguesa dos Direitos Humanos – Civitas que é do interesse público que se promovam controlos automáticos e o incremento da transparência no seio das actividades típicas do Estado, incluindo na Justiça e na autonomia técnica e funcional dos Magistrados.

Consideramos ainda que:

  • “O dever de recusa de cumprimento de ordens ilegais, emanadas de superior hierárquico e o poder de recusa do cumprimento de ordens, do mesmo também emanadas, fundada em violação da consciência jurídica do” não conformam substantiva e adequadamente o princípio da autonomia interna, ao contrário do que o Parecer defende;
  • “A emissão de uma diretiva, de uma ordem ou de uma instrução, ainda que dirigidas a um determinado processo concreto”, não se esgotam no interior da relação de subordinação hierárquica e devem constar do processo, ao contrário do que o Parecer defende.

Portugal e os Portugueses exigem uma Justiça cega, célere e mais transparente, capaz de estar à altura dos desafios que se lhe colocam. O Parecer promulgado pela Senhora Procuradora-Geral da República e actualmente em re-análise, parece-nos não ser coincidente com estes desígnios.

Adicionalmente, a referida re-análise da PGR não se deveria restringir apenas à Conclusão 10.ª do Parecer sobre o acesso ao registo escrito de decisões internas tomadas, mas deveria sim, em primeiro lugar, esclarecer sobre quais os problemas e necessidades identificados que motivaram a solicitação inicial do referido Parecer.

Finalmente, a Liga Portuguesa dos Direitos Humanos – Civitas considera que se deve aproveitar esta oportunidade para levar a cabo uma discussão séria, ponderada e alargada sobre este tema e demais temas conexos à organização da Justiça, como elemento essencial do Estado de Direito.

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